O plástico é um material que foi concebido para ser resistente e recalcitrante à degradação, por isso, é difícil de reciclar. No entanto, essas características o aproximam da madeira, um material naturalmente recalcitrante, degradado por certos fungos filamentosos graças a enzimas especializadas.
Um consórcio de cientistas do INRAE, da Universidade de Bordeaux e da Universidade da Bretanha do Sul conseguiu reprogramar as enzimas chamadas LPMO, que reconhecem a superfície das fibras de celulose, o principal componente da madeira, para fazê-las reconhecer diferentes tipos de plásticos.
Esses resultados, publicados na ACS Chem&Bio Engineering, permitem vislumbrar o desenvolvimento de uma caixa de ferramentas biológica para a reciclagem de plásticos.
A poluição plástica está presente em todo o ambiente, e a gestão de resíduos plásticos é um problema em escala mundial. Além do desenvolvimento de modos de produção e uso mais responsáveis, uma das soluções para esse problema é desenvolver rotas de bio-reciclagem. Este é um desafio científico considerável, pois os plásticos são constituídos de polímeros altamente recalcitrantes à degradação, e foram projetados para isso.
Mas isso os aproxima de outros polímeros recalcitrantes naturais, como a celulose da madeira, que podem ser degradados por fungos filamentosos.
O segredo desses fungos é a sua capacidade de secretar um arsenal completo de enzimas, proteínas específicas que facilitam reações químicas, especialmente as LPMO (monooxigenases líticas de polissacarídeos), que podem degradar a superfície da celulose, enfraquecendo-a para facilitar sua posterior degradação. Essas propriedades as tornam candidatas ideais para evoluir para novas funções, especificamente a degradação de plásticos.
Enzimas-quimera que reconhecem plásticos
As enzimas LPMO são geralmente constituídas por dois módulos: um módulo de ligação que permite à enzima reconhecer e se prender a um polímero específico, aqui naturalmente à celulose, e um módulo catalítico que degrada a superfície da celulose.
Os cientistas concentraram seus esforços no módulo de ligação para substituí-lo por outros módulos, com o objetivo de conferir às enzimas a capacidade de se ligar a diferentes plásticos, utilizando processos de engenharia de proteínas dominados em escala industrial. Eles criaram assim LPMO quiméricas capazes de reconhecer e se ligar a diferentes tipos de plásticos. Algumas delas também foram capazes de perfurar a superfície de um plástico de origem biológica, o PHA (poli-hidroxialcanoato).
Nos próximos trabalhos, os cientistas vão avaliar a capacidade de degradação dessas enzimas-quimera em diferentes tipos de plásticos, a fim de selecionar as mais eficientes e combiná-las em cocktails enzimáticos para degradar os plásticos. O objetivo é criar uma caixa de ferramentas enzimáticas para a bio-reciclagem de plásticos.
Referências:
Munzone A. et al. (2024). Design of Plastic Binding Lytic Polysaccharide Monooxygenases via Modular Engineering.
ACS Chem&Bio engineering
DOI:
https://doi.org/10.1021/cbe.4c00125