Alguns planetas parecem desafiar as regras estabelecidas. É o caso dos Júpiteres quentes que orbitam muito perto de suas estrelas... em sistemas binários, onde duas estrelas coexistem. Um novo estudo propõe uma explicação para essa configuração atípica.
Visão de estrelas binárias a partir de um planeta tipo Júpiter quente Crédito: NASA/JPL-Caltech/T. Pyle
Por muito tempo considerados exceções, esses sistemas exoplanetários podem na verdade revelar mecanismos ocultos de migração planetária. Os pesquisadores se baseiam em um fenômeno conhecido: o mecanismo von Zeipel-Lidov-Kozai (ZLK), que permitiria a um planeta se aproximar gradualmente de sua estrela sob a influência gravitacional de uma estrela vizinha.
Esse processo, lento mas eficaz, poderia explicar como algumas gigantes gasosas acabam em órbitas próximas, contradizendo os cenários clássicos de formação. As simulações realizadas pela equipe, a partir de dados da NASA e do satélite Gaia, permitiram reconstituir a evolução dessas configurações raras.
O estudo também destaca um fator determinante: a distância entre as duas estrelas do sistema. Muito próximas, elas perturbam a formação planetária. Muito distantes, sua influência se torna negligenciável. É necessário um equilíbrio sutil para que o mecanismo ZLK atue eficazmente.
O que é o mecanismo von Zeipel-Lidov-Kozai?
O mecanismo ZLK descreve como a órbita de um objeto celeste pode evoluir sob o efeito gravitacional de um terceiro corpo. Nos sistemas binários, essa interação pode perturbar a órbita de um planeta até fazê-lo migrar para sua estrela.
O efeito só se manifesta se a órbita do planeta estiver inclinada em relação ao plano orbital do sistema binário. Com o tempo, essa inclinação gera variações que, combinadas a outros efeitos, modificam a trajetória do planeta e o levam para uma órbita próxima.
Esse mecanismo, estudado por muito tempo em contextos estelares, mostra-se agora relevante para explicar a presença de planetas massivos muito próximos de sua estrela, um cenário antes inexplicado.
Por que esses sistemas são tão raros?
A raridade desses sistemas se deve a vários fatores. Primeiro, sua formação requer um sistema binário com proporções adequadas. Em segundo lugar, o disco protoplanetário deve permitir o surgimento de uma gigante gasosa - um processo já pouco evidente na presença de uma única estrela, e que se torna ainda mais instável com duas.
Além disso, nem todas as configurações permitem que o mecanismo ZLK atue plenamente. É necessário que a inclinação inicial, a massa dos corpos e a distância entre as estrelas sejam compatíveis com uma migração lenta mas eficaz.
Apesar de sua raridade, esses sistemas representam uma oportunidade valiosa para testar teorias. Eles nos lembram que a diversidade de mundos no Universo frequentemente ultrapassa nossos modelos, e que ainda há muito a descobrir sobre as dinâmicas ocultas da formação planetária.