O sono não é apenas um período de descanso, mas um momento em que o nosso cérebro trabalha ativamente para organizar as nossas memórias. Um estudo recente explora como as diferentes fases do sono influenciam a maneira como conservamos os detalhes das nossas experiências, revelando mecanismos que moldam a nossa memória ao longo da noite.
O estudo, publicado na
Communications Biology, analisou 32 jovens adultos saudáveis que aprenderam associações entre palavras e imagens. Durante a sua aprendizagem, a sua atividade cerebral foi registada através de um eletroencefalograma (EEG), uma técnica que mede as ondas cerebrais na superfície do cérebro. Os participantes passaram depois uma noite de sono sob vigilância EEG, e a sua memória foi testada na manhã seguinte para observar as mudanças na representação cerebral das memórias.
Os investigadores usaram um método de análise de similaridade para comparar os padrões cerebrais antes e depois do sono. Eles constataram que as ondas relacionadas com memórias específicas, como uma imagem precisa de um animal, enfraqueciam após a noite, enquanto os sinais correspondentes a categorias mais amplas, como o conjunto de imagens de animais, permaneciam estáveis. Esta transformação era mais marcada nas pessoas que passaram mais tempo em sono REM, indicando que esta fase pode ajudar o cérebro a integrar novas informações com os conhecimentos existentes.
Segundo Jing Liu, autora principal do estudo, estes resultados mostram que o sono não só reforça a memória, mas também reorganiza a sua representação no cérebro. O sono REM parece favorecer a generalização, ligando as novas memórias a conceitos mais vastos, enquanto o sono profundo, caracterizado por ondas lentas, contribuiria para preservar os detalhes originais. Esta complementaridade sugere que o cérebro equilibra precisão e flexibilidade durante a noite.
George Dragoi, especialista não envolvido no estudo, indica que o sono REM e o sono profundo não se opõem, mas sustentam diferentes aspetos da memória. Por exemplo, o sono profundo poderia ser crucial para as memórias de experiências específicas, enquanto o sono REM ajudaria a construir conhecimentos gerais. Manter horários de sono regulares é portanto importante, pois uma boa qualidade de sono está ligada a uma função cognitiva saudável e a uma memória mais adaptável.
No entanto, Liu precisa que estes resultados mostram associações e não relações de causa e efeito. Pesquisas futuras, combinando o EEG com registos intracranianos, poderiam identificar os circuitos cerebrais envolvidos. Experiências visando reativar memórias durante o sono, por exemplo com sons ligados à aprendizagem, poderiam também esclarecer como o sono influencia a nossa capacidade de usar os nossos conhecimentos de maneira flexível.