Durante sessenta anos, os cientistas acreditavam que a principal função de uma enzima, chamada HSL, era libertar as gorduras armazenadas. Mas surgiu um paradoxo: as pessoas que nascem sem esta enzima veem a sua massa gorda diminuir, e não aumentar. Este enigma biológico acaba de ser resolvido pelo professor Langin e pela sua equipa.
As células de gordura, ou adipócitos, não são simples reservatórios inativos. Elas contêm estruturas, as gotículas lipídicas, onde as gorduras são armazenadas à espera de serem utilizadas. Quando o corpo precisa de energia, por exemplo entre as refeições, ativa a proteína HSL. Esta age como uma chave para desbloquear essas reservas. Esta enzima responde principalmente à adrenalina, uma hormona libertada em situações de jejum ou stresse, o que desencadeia a libertação de ácidos gordos para alimentar os órgãos.
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A surpresa veio do estudo de pessoas e ratos nascidos sem o gene que produz a HSL. Ao contrário do que se poderia pensar, esta ausência não provoca uma acumulação de gordura, mas sim uma redução do tecido adiposo, uma condição médica chamada lipodistrofia. Esta observação contrária à teoria obrigou os investigadores a reconsiderar o funcionamento desta enzima. Que as células de gordura sejam defeituosas porque estão em excesso (como na obesidade) ou em insuficiência (como na lipodistrofia), elas provocam desregulações metabólicas semelhantes, prejudiciais para a saúde cardiovascular.
A equipa de investigação de Toulouse fez uma descoberta maior ao encontrar a HSL num local inesperado da célula: o seu núcleo. Embora fosse conhecida principalmente à superfície das gotículas de gordura, esta enzima está também presente no centro de comando da célula. Jérémy Dufau, coautor do estudo, precisa que no núcleo, a HSL interage com muitas outras proteínas para participar num programa de manutenção celular, essencial ao bom funcionamento do tecido adiposo.
O sistema de regulação da HSL revela-se muito sofisticado. A adrenalina, que ativa a enzima à superfície das gotículas de gordura, provoca ao mesmo tempo a sua saída do núcleo durante os períodos de jejum. Fato crucial, os ratos obesos apresentam uma concentração anormalmente elevada de HSL no núcleo. Dominique Langin sublinha que esta dupla localização explica finalmente o mistério da perda de gordura observada nos pacientes sem HSL e abre novas perspetivas para compreender as doenças metabólicas como a obesidade e as suas complicações.
O tecido adiposo: muito mais do que um simples armazenamento
O tecido adiposo é um verdadeiro órgão, capaz de produzir e segregar numerosas hormonas e moléculas de sinalização, chamadas adipocinas. Estas substâncias influenciam diretamente o apetite, a forma como o corpo reage à insulina e o nível de inflamação no organismo.
Existem diferentes tipos de células de gordura. Os adipócitos brancos, os mais numerosos, armazenam a energia. Os adipócitos castanhos, por sua vez, queimam calorias para produzir calor. Esta diversidade celular permite uma regulação fina do nosso equilíbrio energético e da nossa temperatura.
A localização da gordura corporal é também muito importante para a saúde. A acumulação de gordura ao nível da barriga está particularmente associada a complicações metabólicas, enquanto a gordura localizada nas ancas e nas coxas apresenta menos riscos.
O tecido adiposo tem também uma capacidade de expansão notável. Em caso de excesso prolongado, as células de gordura existentes aumentam de volume e novas células podem formar-se a partir de células estaminais especializadas, um processo chamado adipogénese.