⚡ Primeira detecção de relâmpagos em Marte

Publicado por Adrien,
Fonte: Nature
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Quando pensamos em relâmpagos, a imagem que vem à mente é a das tempestades terrestres. Mas em Marte, um planeta onde a água é rara, a ideia de descargas elétricas parece improvável. No entanto, uma observação recente abalou essa percepção.

A equipe de Baptiste Chide, do Instituto de Pesquisa em Astrofísica e Planetologia, utilizou o microfone do rover Perseverance para captar sinais inesperados. Ao longo de 29 horas de gravação em dois anos marcianos, 55 eventos elétricos foram identificados. Esses sinais se manifestam por uma interferência na eletrônica do microfone, seguida por uma onda de choque real produzida pela descarga. Este método auditivo permitiu detectar fenômenos que escapavam aos instrumentos tradicionais.


Ilustração de um relâmpago descarregando durante uma tempestade de poeira em Marte.
Crédito: NASA

Essas descargas elétricas marcianas diferem radicalmente das da Terra. Em nosso planeta, o raio surge principalmente do atrito entre partículas de gelo nas nuvens. Em Marte, é o atrito dos grãos de poeira, levantados pelos ventos ou pelos redemoinhos, que gera eletricidade. Daniel Mitchard, físico da Universidade de Cardiff, explica que o limiar de descarga, ligado à pressão atmosférica, é muito mais baixo no planeta vermelho (explicação no final do artigo). Assim, os relâmpagos marcianos são mais fracos e mais próximos da superfície.

A maioria dos eventos registrados coincide com ventos fortes ou a passagem de redemoinhos de poeira perto do rover. Esta conexão estreita com as tempestades localizadas indica que as descargas poderiam influenciar a química marciana. Os oxidantes como o peróxido de hidrogênio, cuja presença era inexplicada, poderiam ser produzidos por esses fenômenos elétricos, o que tem consequências para a busca de traços de vida (veja abaixo).

Capturar visualmente esses relâmpagos continua difícil. Muitos ocorrem durante o dia, são muito breves e frequentemente mascarados pela poeira. As descargas maiores, provenientes do próprio rover, medem apenas algumas dezenas de centímetros. Para observá-las, seriam necessárias câmeras de alta velocidade e alta resolução, atualmente ausentes em Marte. Esta limitação, no entanto, abre caminho para futuras missões melhor equipadas.


O rover Perseverance.
Imagem Wikimedia

Além de Marte, esta descoberta amplia as perspectivas. É a primeira vez que descargas elétricas são detectadas em um planeta rochoso além da Terra. Fenômenos similares poderiam existir em Vênus ou em Titã, a lua de Saturno. Em Marte, a eletrificação das poeiras poderia até amplificar as tempestades ao facilitar o levantamento das partículas, desempenhando assim um papel no ciclo climático global.

As implicações para a exploração espacial são diretas. Ao quantificar a energia dessas descargas, os engenheiros poderão proteger melhor as missões futuras, incluindo os trajes espaciais para astronautas. O estudo, publicado na Nature, marca uma etapa em nossa compreensão do ambiente marciano. Ele lembra que mesmo em planetas aparentemente calmos, a eletricidade pode surgir de forma inesperada.

O limiar de descarga elétrica em Marte


O limiar de descarga, ou 'breakdown threshold', é um conceito chave para entender por que os relâmpagos em Marte diferem dos da Terra. Ele representa a quantidade de carga elétrica necessária para que uma nuvem de partículas se descarrege na atmosfera. Na Terra, a pressão atmosférica é de cerca de uma atmosfera, o que torna o ar mais isolante. Assim, são necessários cerca de três megavolts por metro quadrado para que o relâmpago ocorra, exigindo acúmulos de carga significativos nas nuvens de tempestade.

Em Marte, a pressão na superfície é de apenas 0,006 atmosfera, o que reduz consideravelmente o efeito isolante do ar. Consequentemente, o limiar de descarga é muito mais baixo, em torno de 15 quilovolts por metro quadrado. Esta diferença significa que quantidades menores de carga, geradas pelo atrito das poeiras, são suficientes para provocar descargas elétricas. É por isso que os relâmpagos marcianos são mais fracos e mais localizados perto da superfície.

A composição atmosférica também desempenha um papel. A atmosfera terrestre, rica em nitrogênio e oxigênio, é um bom isolante elétrico. Em Marte, a atmosfera é composta principalmente de dióxido de carbono, o que altera as propriedades elétricas. Esses fatores combinados explicam por que as descargas em Marte se assemelham mais a faíscas estáticas do que aos grandes relâmpagos terrestres, com implicações para a segurança dos equipamentos em missão.

Compreender este limiar ajuda a prever onde e quando esses fenômenos podem ocorrer, essencial para as futuras explorações robóticas ou humanas. Isso permite projetar sistemas eletrônicos resistentes a interferências elétricas, garantindo a confiabilidade das missões no planeta vermelho.
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