A espécie Canis simensis é um dos canídeos mais raros e ameaçados do mundo, com uma população de menos de 500 indivíduos. Habitando os planaltos da Etiópia, esse lobo é geralmente carnívoro. No entanto, recentemente, pesquisadores observaram um comportamento insólito: alguns desses lobos consomem néctar de flores locais.
Um lobo da Etiópia lambendo néctar em uma inflorescência de Kniphofia foliosa (a) em um grande campo desta planta no vale de Web, no Parque Nacional das Montanhas de Balé, Etiópia (b). O focinho do lobo carrega uma carga significativa de pólen (c). Uma fêmea adulta e uma fêmea subadulta procuram juntas néctar de K. foliosa (d).
O néctar em questão provém da Kniphofia foliosa, uma planta encontrada nos planaltos etíopes. Essas flores, conhecidas como "tocha de Satanás", atraem uma variedade de polinizadores. Porém, lobos foram observados, pela primeira vez, alimentando-se delas. Durante suas incursões, alguns lobos visitaram até 30 flores, e seus focinhos cobertos de pólen sugerem que eles podem desempenhar um papel na polinização.
Essa observação foi realizada por uma equipe da Universidade de Oxford, que acompanhou lobos pertencentes a diferentes alcateias por vários dias. Eles constataram que os lobos jovens aprendem com seus mais velhos, seguindo-os pelos campos de flores, o que pode indicar uma transmissão social do comportamento. Essa prática, embora surpreendente, parece ser bastante comum entre os lobos da Etiópia.
Os pesquisadores ainda estão investigando a extensão desse comportamento. Embora o lobo possa transferir pólen de uma flor para outra, ainda não está claro se esse ato contribui efetivamente para a polinização das plantas. No entanto, caso isso seja confirmado, o lobo da Etiópia poderá se tornar o primeiro grande carnívoro conhecido por desempenhar um papel na reprodução das plantas.
Essa descoberta abre uma nova perspectiva sobre as interações entre as espécies. Os cientistas cogitam que esse comportamento seja uma resposta à redução das presas, oferecendo aos lobos uma fonte alternativa de nutrição. O néctar, embora doce, permanece marginal na dieta desses predadores, mas pode ser um complemento interessante durante períodos de escassez alimentar.
Esse fenômeno de coleta de néctar por um grande carnívoro não é inédito. Outros mamíferos, como alguns primatas ou marsupiais, já foram observados polinizando plantas. No entanto, este é o primeiro caso documentado envolvendo um predador carnívoro de grande porte.
As implicações dessa descoberta são vastas. Se os lobos da Etiópia forem efetivamente polinizadores, isso pode alterar nossa compreensão dos papéis ecológicos dos carnívoros. Também seria uma oportunidade única de explorar a coevolução entre esses animais e as plantas que poderiam ajudar a reproduzir.
Pesquisas futuras deverão confirmar se essa interação é realmente benéfica para as flores. Isso também pode permitir uma melhor compreensão das necessidades alimentares dos lobos da Etiópia e dos fatores que influenciam seu comportamento alimentar.