Enquanto o JWST observava TRAPPIST-1, o sistema com sete exoplanetas, uma equipe internacional de pesquisadores, incluindo o Departamento de AstrofÃsica do CEA Paris-Saclay, percebeu que passageiros celestes entravam regularmente no campo de visão.
Eles então desenvolveram um método para estudá-los e identificaram 138 novos asteroides da cintura principal. Esses corpos celestes, variando do tamanho de um ônibus ao de vários estádios, representam os menores asteroides já detectados nessa região do espaço.
Graças a essa nova abordagem, os pesquisadores agora podem detectar asteroides com apenas 10 metros de diâmetro, abrindo caminho para uma exploração aprofundada dos pequenos objetos do sistema solar. Esse avanço é crucial para entender melhor a história do sistema solar e para melhorar o monitoramento de asteroides potencialmente perigosos, fortalecendo assim a segurança planetária.
Este estudo foi publicado na prestigiosa revista Nature, com o tÃtulo "
JWST sighting of decameter main-belt asteroids and view on meteorite sources ".
A observação de asteroides da cintura principal, uma busca difÃcil
O asteroide que causou a extinção dos dinossauros media cerca de 10 quilômetros de diâmetro, equivalente à largura de Brooklyn. Um impactor desse tamanho atinge a Terra muito raramente, com uma frequência estimada entre uma vez a cada 100 e 500 milhões de anos. Por outro lado, asteroides muito menores, comparáveis ao tamanho de um ônibus, podem atingir a Terra com muito mais frequência, a cada poucos anos, pois são muito mais numerosos (ver Figura 1).
Figura 1 - Distribuição de tamanho dos asteroides da cintura principal, predominantemente povoada por asteroides pequenos, enquanto os grandes asteroides são muito mais raros, seguindo uma lei de potência. Créditos: Marco Colombo — DensityDesign Integrated Course Final Synthesis Studio
Esses asteroides, chamados de "decamétricos" devido ao seu diâmetro de cerca de dez metros, são capazes de gerar ondas de choque que podem causar danos em escala regional, como na explosão de 1908 em Tunguska, na Sibéria, ou em 2013 no céu de Chelyabinsk, nos Urais.
Esses asteroides vêm principalmente da cintura principal, localizada entre Marte e Júpiter, onde milhões de corpos celestes orbitam. Catalogar esses asteroides é fundamental, tanto para a pesquisa cientÃfica — para elucidar as origens e a evolução do sistema solar — quanto para a segurança planetária — identificando os asteroides próximos da Terra, cujas órbitas cruzam a da Terra e que podem representar uma ameaça.
No entanto, até recentemente, os instrumentos disponÃveis só permitiam detectar na cintura principal asteroides com pelo menos um quilômetro de diâmetro. Essa limitação é insuficiente, já que a maioria dos asteroides nessa região é muito menor. Além disso, esses pequenos asteroides têm uma probabilidade maior de deixar a cintura principal e se tornarem objetos próximos da Terra, aumentando o risco de causar danos significativos ao nosso planeta. Uma melhor capacidade de detectar esses corpos pequenos é, portanto, crucial para enfrentar esses desafios.
Figura 2 - Descoberta de novos asteroides com o JWST durante a observação do sistema TRAPPIST-1. Créditos: Burdanov, de Wit et al., 2024, Nature. a. Empilhamento de 500 imagens da estrela ultrafria TRAPPIST-1. Dois asteroides conhecidos (2004 GH89 e 2016 UR72) se destacam por uma trilha branca visÃvel à esquerda da imagem. Sua luminosidade é tal que aparecem nas imagens individuais. Por outro lado, quatro outros asteroides (#113, #109, #112 e #111), até então desconhecidos, só revelam sua presença após o empilhamento de centenas de imagens. Suas trajetórias são indicadas por linhas pontilhadas. b. Imagens dos quatro novos asteroides (#113, #109, #112 e #111) acompanhadas de suas propriedades respectivas: velocidade (V, em arcseg/min), ângulo de posição (PA, em graus) e fluxo (F, em ?Jy). Esses asteroides foram descobertos graças à técnica de "deslocamento e empilhamento", que consiste em recentrar as imagens sucessivas na posição dos objetos e depois sobrepô-las. Esse método melhora a relação sinal/ruÃdo, revelando assim objetos invisÃveis em uma única imagem.
Do indesejado ao desejado: quando "parasitas" se tornam uma oportunidade cientÃfica
No âmbito do programa intitulado "
TRAPPIST-1 Planets: Atmospheres Or Not? ", co-dirigido pelo Departamento de AstrofÃsica (DAp) do IRFU do CEA Paris-Saclay, o telescópio espacial James Webb (JWST) observou o sistema exoplanetário TRAPPIST-1 usando o instrumento MIRI. O objetivo era estudar a curva de fase das duas primeiras planetas, TRAPPIST-1 b e c, para acompanhar a evolução de seu fluxo luminoso em uma órbita completa. Esse tipo de observação permite medir a emissão térmica das diferentes faces de cada planeta e estudar a distribuição de calor em sua superfÃcie, com o objetivo de confirmar ou refutar a presença de uma atmosfera.
Para cobrir um perÃodo orbital completo das planetas b e c (respectivamente 1,5 dia e 2,42 dias), as observações se estenderam por cerca de 60 horas, constituindo assim o programa de observação contÃnua de uma estrela mais longo realizado pelo JWST para o estudo de exoplanetas, explica Elsa Ducrot, pesquisadora do Departamento de AstrofÃsica do CEA, co-lÃder desse programa de observação e co-autora deste estudo.
Durante a análise dessas observações, uma equipe de pesquisa internacional, liderada pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT, EUA) e incluindo o DAp, percebeu que elas estavam poluÃdas por asteroides cruzando o campo de visão (ver figura 2a). Embora o campo seja muito pequeno (56,3" × 56,3"), muitos asteroides aparecem regularmente, pois TRAPPIST-1 está localizado no plano da eclÃptica, onde se encontram os objetos do sistema solar, especialmente os da cintura principal.
"Para a maioria dos astrônomos, os asteroides são considerados pragas do céu: eles cruzam o campo de visão e perturbam os dados", observa Julien de Wit, co-autor principal deste estudo e pesquisador do MIT.
No entanto, em vez de simplesmente limpar os dados desses "parasitas", como é feito normalmente, os pesquisadores se perguntaram se essas informações não poderiam ser usadas para identificar asteroides em nosso próprio sistema solar. Para isso, eles usaram uma técnica chamada "deslocamento e empilhamento", desenvolvida na década de 1990. Esse método consiste em deslocar e empilhar várias imagens de um mesmo campo de visão para destacar um objeto fraco que estaria escondido no ruÃdo.
Uma nova janela para o espaço
A presença de TRAPPIST-1 no campo do instrumento MIRI representa uma oportunidade única, pois sua sensibilidade no infravermelho médio o torna uma ferramenta perfeitamente adaptada para a observação de asteroides. Na luz visÃvel, apenas a luz solar refletida pelo asteroide é perceptÃvel. Se ele for pequeno e distante, o fluxo luminoso se torna extremamente fraco. Por outro lado, no infravermelho, captamos a luz emitida diretamente pelo asteroide, o que aumenta consideravelmente o fluxo observável. Graças ao seu grande poder coletor e à sua visão infravermelha, o JWST se revela um instrumento ideal para detectar pequenos corpos do nosso sistema solar.
Ao processar mais de 10.000 imagens do sistema TRAPPIST-1 tiradas pelo JWST, a equipe identificou oito asteroides já catalogados na cintura principal. Aprofundando a análise dos dados, eles conseguiram detectar 138 novos asteroides, todos com diâmetros de algumas dezenas de metros (ver figura 2b). Esses objetos constituem os menores asteroides já observados nessa região até hoje, permitindo explorar uma nova população de asteroides (ver figura 3).
"É uma região completamente nova do espaço que estamos explorando graças às tecnologias modernas", acrescenta Artem Burdanov, autor principal do estudo e pesquisador do MIT. "É um excelente exemplo do que podemos alcançar ao analisar os dados de forma diferente. Às vezes, os resultados superam nossas expectativas, e esse é o caso aqui."
Os pesquisadores planejam explorar esse método para identificar e rastrear novos asteroides próximos da Terra, cujas órbitas cruzam a da Terra.
"Já conseguimos detectar objetos próximos da Terra medindo até 10 metros quando estavam muito perto de nós", explica Artem Burdanov. "Agora, temos uma maneira de detectar esses pequenos asteroides muito mais longe, o que nos permite realizar um acompanhamento orbital mais preciso, essencial para a defesa planetária."
Figura 3 - Ilustração artÃstica representando uma mirÃade de pequenos asteroides da cintura principal revelados pelo JWST. Créditos: Ella Maru, Ella Maru Studio